Morar no litoral catarinense me faz ter acesso a muitas belezas naturais, um voo de 2h até Buenos Aires direto, e pouco acesso a atividades culturais mais “diferentes”.
Peças de teatro, shows e até mesmo alguns filmes, simplesmente pulam direto de Curitiba a Porto Alegre, por falta de infraestrutura, de interesse, vai saber.
Mas desde o ano passado, muito naturalmente, voltamos a frequentar shows de música, por aqui. O fato de eu ser uma matutina contumaz piora a frequência de saídas, mas com planejamento, um energético e negociações, a gente sai da toca.
No ano passado, acho que cheguei a comentar nessa news aqui, que aproveitamos um final de semana em São Paulo de congresso para ir ao teatro. Vimos o maravilhoso Recém Nascido, de Pedro Cardoso, e o Norma, com Nivea Maria (esse inclusive chegou a Floripa, meses depois).
A minha formação profissional tem me levado muito a São Paulo, para congressos de Nutrição, e com isso, as peças de teatro têm acontecido mais. Se tornou um ritual meu, uma coisa que sempre faço: olho a programação do teatro mais próximo de onde estou, para poder assistir a alguma peça.
O Recém Nascido foi uma experiência tão grata, que incentivei meus pais a irem, que amaram tanto que até hoje repetem alguns bordões. A gente vê um pouquinho de Augustinho Carrara em Pedro? Sim, não tem como desvencilhar, mas o texto é tragicômico.
A gente ri certas horas meio que de nervoso, por que um recém nascido é tão frágil e autocentrado, ao mesmo tempo, que não tem como não sentir um carrossel de emoções junto com o recém nascido.
Achei meio psicanalítico em certos momentos (bom avisar que só conheço psicanálise de orelhada), mas a conexão com a Mãe, com o seio da Mãe, e o Gigante, este ser que vai crescendo ao redor do recém nascido, é lotado de simbolismos.
Basicamente o recém nascido nunca deixa de gritar e espernear dentro de nós, e eventualmente, ele consegue assumir o controle sobre o Gigante, que é essa nossa versão que vai crescendo e se desenvolvendo.
Nessa noite, emendamos uma peça de teatro na outra, uma forma de fazer render o tempo em São Paulo. Assistindo da fileira 4, via as gotas de suor na testa dos atores, e me sentia encantada com a doação que o corpo humano realizava, quando em palco.
Em menos de um ano, eu tive a oportunidade de assistir no palco nomes de atores que costumava conhecer apenas nos créditos das novelas: Nivea Maria, Eliane Giardini, Marcos Caruso, Matheus Solano, Antônio Fagundes, Christiane Torloni…

Peguei gosto por essa coisa de me arrumar, preparar um casaco (pois nunca se sabe da climatização), uma garrafinha de água, e sair com bastante antecedência de casa para ver algo que não compõe o meu cotidiano.
No comecinho desse ano, colocamos um ritmo bom de ir ao cinema todos os sábados à tarde, esperando a nossa premiação do Oscar. Saíamos por volta de meio-dia de casa, almoçávamos no meu buffet preferido no centro da cidade, e geralmente pegávamos a sessão de 14h30.
Dava tempo de passear um pouquinho vendo as vitrines, olhando roupas bonitas (ou nem tanto), conferir a livraria (perdeu em 100% das vezes para a Amazon), e comer um cookie artesanal que fica ali na rua de cima do shopping.
Vimos O Brutalista, Conclave, o nosso amado Ainda Estou Aqui, A Substância. Falávamos de filmes, de cenas, de detalhes técnicos que não sei julgar. Saíamos do assunto do dia-a-dia, para falar de arte.
Em março, o balé Bolshoi do Brasil, que fica na minha cidade natal, completou 25 anos. E para comemorar, encenaram O Lago dos Cisnes com um elenco imenso, cenografia inacreditável, figurinos, mais de uma centena de pessoas envolvida.
E foi com o livreto do programa do balé, que pude entender essa historinha que nunca foi contada de outra maneira, que não em música, e um narrador onisciente que ajudava antes de cada ato iniciar.
Se você, assim como eu, não conhece a história, achei esse resuminho aqui.
Tive vontade de reassistir o Cisne Negro, filme tão aclamado lá em 2010, e que embora eu pudesse ter entendido, me faltava o repertório para compreender todas as nuances de diferença entre o cisne branco e negro.
Revi algumas vezes não só os meus próprios registros do espetáculo, mas também fiz o movimento de pesquisar o que não entendia, ver as publicações a respeito do espetáculo, falei disso com amigos.
A apresentação durou 90min, mas dentro de mim, viveu com nitidez por pelo menos uma semana, para depois deixar uma marca mental, uma memória que provavelmente permanecerá por muitos anos.
Foi mudando também o meu algoritmo nas redes sociais, esse movimento: agora, sou impactada por anúncios de outras peças de teatro, e posso ir programando atividades diferentes para preencher os dias livre (ou nem tanto).
Partes de mim estão sendo nutridas de informações e de sensações para as quais não fui propriamente preparada - se é que algum brasileiro médio da minha idade foi.
O nada que sei sobre arte, veio de um movimento consciente de buscar letramento, repertório, por entender que isso me faria um ser humano mais completo. Nunca me foi instintivo ou algo com que eu tenha crescido sendo exposta.

Mas mais importante do que “ser alguém que” vai ao teatro, ser alguém que assiste balé, é ser alguém que encontrou algo a fazer no presencial, com pessoas de carne e osso mostrando ao que andaram se dedicando nos últimos meses/anos.
As fotos e vídeos são proibidos, para não atrapalhar os artistas no palco, e isso acaba sendo uma ajudinha para não me ver vítima dos dedinhos condicionados a tudo querer gravar ou fotografar.
Assistir a um espetáculo ao vivo exige um pouco de entrega também da plateia, você precisa se deixar levar por um entretenimento que concorre com diversas alternativas online altamente dopaminérgicas.
Assim como algumas pessoas se referem à internet como algo que a gente antigamente entrava, e hoje precisa sair, eu vejo que espetáculos já foram um mergulho, mas hoje são a minha subida à superfície.
O investimento em ingressos varia muito, nem sempre é acessível, mas acho que vale planejar algumas ocasiões ao ano.
O que você tem visto? O que tem te interessado?
Eu sou diretora de teatro e botei teatro na busca, apareceu seu texto. Vc não sabe o sorriso que me abriu na boca.
Amei sentir esse envolvimento artístico! Depois que me tornei mãe, confesso que deixei tudo isso bem de lado, principalmente os shows e festivais de música que eu tanto gostava. Mas já estou ensaiando para estar presente no festival de dança!