Espero não só te encontrar bem - espero que ontem tenha sido a melhor segunda-feira do seu ano.
Que você tenha acordado com aquela sensação gostosa de quem repousou, e que tenha o dia inteiro para você.
Se escolheu estar acompanhada(o) ontem, que os encontros tenham sido realmente bons para todos os envolvidos. E caso tenha ceado, que tenham comidas que você gosta.
Eu não gosto de Natal.
Eu não gosto de nenhuma das comidas comumente servidas nas ceias (peru, pavê, pudim, salpicão). Acho tudo excessivamente pesado, gorduroso e quente pra dezembro.
Eu também não gosto do ritual dos presentes. Sofro escolhendo, fico sempre com a constrangedora sensação de que errei, e raramente gosto daquilo que ganhei.
Mesmo assim, eu participei de acordo com as regras estabelecidas muito antes do meu nascimento, pela minha avó - que já morreu.
Quando criança, nosso Natal era todo muito cedo, para que minha avó pudesse estar na Missa do Galo. Trocávamos presentes no entardecer, ceávamos na sequência, e íamos para casa.
Muitos anos depois, ela decidiu que a ceia poderia sim ser mais tarde, por que ela tinha muita consideração pelo padre e queria a presença dele na ceia, após a missa.
Sabe o que aconteceu? A maioria do pessoal não gostou nada dessa mudança, sendo que haviam passado os primeiros anos reclamando que todo mundo precisava antecipar o Natal.
Moral da história: se nem minha avó conseguiu ser unânime, quem sou eu para tentar?
Anos atrás, meus pais foram morar na Eslováquia, um país muito frio e com aquele Natal clichê de filme: crianças cantando num palco montado dentro do Christmas Market.
Biscoitos de especiarias, enfeites vermelhos contra um mar de branco e pouquíssima luz solar. Vinho quente, pães com salsichas condimentadas e repolho fermentado (delicioso, viu?).
Isso me ajudou a gostar mais da decoração - continuei sem gostar da ceia. Assistir filmes de Natal me ajudou a gostar das musiquinhas.
E ano retrasado, quando fui para a terra do hygge, fiquei encantada com a centralidade do aconchego no Natal escandinavo. Inclusive, o livrinho de Meik Viking finalmente ganhou versão em português.
Dito tudo isso, ano após ano eu venho aprimorando a arte de apreciar algumas coisas nesse dia, para não ficar associando a data apenas a coisas negativas.
Já no dia 24 mesmo eu começo a anotar coisas que as pessoas elogiaram, dos presentes (isso me dá alguma ideia para o ano seguinte).
Comecei a levar em toda ceia alguma coisa que eu gosto de comer. Esse ano, fiz uma tábua de frios, e levei banoffee de sobremesa, sem lactose.
Não faço hora extra na ceia. 364 dias do ano, estou na cama por volta de 20h45. Na noite de Natal e Reveillon, eu posso dormir logo depois da meia-noite.
Alguém se desagrada, sempre. Mas como a historinha da minha avó deixou claro, isso não é critério de decisão.
E finalmente, chegamos ao dia 25. O dia 25 é feriado, e minhas obrigações terminaram dia 24.
E se o Natal é tempo de tradições, eu penso que posso criar as minhas.
Então no dia 25, quando acordei, fomos à praia. O dia estava especialmente rachando de sol, a água não mais fria, mergulhar e tirar o ranço de entubar as festividades foi um alívio.
Ao chegar em casa, almoçamos sobras de ceia - aquela que eu não gosto. Aprendi com isso que, ano que vem, preciso comprar algo que eu realmente queira comer, para me sentir bem no dia 25.
Não é só que eu não gosto de comida de ceia, eu não gosto de repetir prato. Peguei essa frescura do meu pai, que nunca comeu na janta o mesmo que comeu no almoço. Agora eu costumo calcular pra nunca sobrar, e caso sobre, congelo para comer daqui a semanas, como se fosse algo totalmente novo.
Mas ontem, o combo de poucas horas de sono, com aquela ressaca (literal e metafórica) de um pós festas, me deixou sem energia pra improvisos. Ano que vem eu deixo algo pronto.
Assistimos o Grinch, um clássico que envelheceu maravilhosamente bem. Queria demais que investissem em roteiros bons, e não só em cenografia, nessa horda de filminhos de Natal que sai todos os anos.
E a cerejinha do meu sundae foi: encontrar um livro velho e puído de Agatha Christie, chamado Um Crime Adormecido. Li 75 páginas ontem, de prazer e familiaridade.
Era comum ganhar uns livrinhos no Natal, todo mundo, e às vezes em viagens de férias, eram livros de Agatha Christie que lia. Se um dia eu ler todos, provavelmente começarei a reprisar.
Se você quiser umas dicas ayurvédicas para sua digestão passado o Natal, clique aqui para ler a edição do ano passado.