Citando a mim mesma em diversas oportunidades, mas sempre falando sobre estudos, o tempo passa de qualquer jeito. E foi com esse pensamento e um salto de fé, que me matriculei na faculdade de Nutrição, um ano e meio atrás.
Clique aqui, para ler o dia que contei dessa decisão.
Desde então, passei por um grande número de desconfortos. Intelectual, pois sempre fui de humanas e tive que mudar meu sisteminha aqui para aprender ciclo de krebs e organelas de microbiologia.
Social, pois por mais que tenhamos um mesmo interesse, eu e minha turma ainda somos a soma das individualidades. Sou muito diferente de todas as minhas colegas, que por sua vez, são muito diferentes entre si.
Há um grande desconforto corporal, também, pois um corpo de 40 anos não se sujeita aos bancos duros da sala de aula por 3h à noite sem tentar se rebelar. Escrevo isso com dores lombares, sabendo que hoje tem aula.
Todos esses desconfortos, porém, já se tornaram conhecidos meus. O desconhecido dói mais, incomoda mais. Hoje, navego com mais tranquilidade pelas apostilas de Fisiologia, nem tudo parece aramaico, as coisas vão fazendo sentido.
O conhecimento vai se empilhando, se conectando.
Daí que no meio desse ano, terminada minha formação em hatha yoga, eu já emendei a pós graduação em Saúde Mental e Comportamento Alimentar. Tudo assim junto, que eu já tenho 40 anos e se quero começar numa profissão nova, preciso me agilizar.
A pós, que deixei para iniciar quando já tivesse terminado todo o conteúdo básico (os 4 primeiros semestres), ao invés de dificultar esse processo, tem facilitado. É como se fosse um “reforço escolar”, só que muito puxado.
As coordenadoras do curso são gentis, sábias e eu me sinto muito bem aula após aula da pós graduação. Evoluí muito como aluna quando comecei a estudar em duas instituições.
No primeiro semestre de 2025, já inicio meu estágio na Unidade Básica de Saúde. Aqui, Assistente Social e Nutricionista vão se encontrar dentro de mim, e eu confesso não estar preocupada com isso.
Estágios em restaurante e clínica me preocupam mais; não me parece que estarei mais pronta daqui a 6 meses do que estou hoje. Mas como o processo tem sido recompensador e com evoluções nítidas, estou confiando.
Aí chegamos ao tema de hoje, de uma pequena mudança que iniciei na data de hoje. Foi pequena, mas foi simbólica.
Em setembro, fui ao Congresso Internacional de Nutrição Funcional em São Paulo. Trouxe para casa alguns suvenires, dentre eles, o meu cracházinho de congressista.
Quando vi a cordinha do crachá, pensei: vou usar para ir trabalhar, que o meu da repartição está feinho. Como vocês podem verificar por si mesmos:
Ontem, arrumando minha escrivaninha, joguei fora o crachá de congressista e levei a cordinha na bolsa. Quando troquei, fiquei incomodada logo de início: as cores são muito diferentes, sobressai na minha roupa.
Logo pensei que todos iriam reparar na minha cordinha diferente(spoiler: não, ninguém ligou). Fui destrocar a cordinha, e olhei para a minha cordinha anterior: sujinha, envelhecida. Meu crachá até já quebrou num pedacinho.
E então pensei de novo: é por isso mesmo que vou trocar, para me sentir incomodada.
Não é fácil para alguém que tem sido funcionária pública federal por 15 anos trocar o seu garantido salário e benefícios pelo incerto mundo de empreender e ter consultório particular.
Ainda menos quando você vê páginas postando publicações assim:
Achei de uma serendipidade essa postagem me aparecer justo hoje, quando decido dar um pequeno e simbólico passo rumo ao desconhecido.
Não acho que vai ser fácil sempre, mas sei também que não é fácil viver a vida de funça, onde tentamos nos manter acima do nível da água, respirando, evitando o afogamento do cinismo e da rotina de todo santo dia.
Calhou de bem nesse mês, eu estar lendo O Deserto dos Tártaros, de Dino Buzzati, e me tocou profundamente os diálogos em que o personagem principal, recém formado tenente numa escola militar, chega num forte para seu primeiro emprego.
Ele não quer ficar, e na verdade tem planos de sair. Daí um dia, conversando com um colega, o colega diz que sua permanência ali era absolutamente provisória.
E os colegas debocham, falando que o provisório dele já durava quinze anos.
Eu tenho 15 anos de concurso… e jamais imaginei que ficaria todo esse tempo.
Não sou ingrata, e evito o mau humor crônico de quem já não espera mais nada do lugar onde tira o sustento. Só posso afirmar que não aguento mais viver todos os dias o mesmo dia.
E é por esse incômodo, esse desconforto do permanecer, que eu comecei a me movimentar um tempo atrás. Está ficando mais perto do dia em que não conseguirei conciliar as atividades.
Duas carteirinhas profissionais, dois espaços de atuação, não é o que quero viver.
Auspiciosamente, 15 anos depois, abriu concurso na repartição, e duas vagas para o meu cargo também. Espero, que quando chegue a hora, eu entregue o bastão com dignidade e um novo fôlego, renovado, chegue para ocupar o meu lugar.
Eu mesma, terei que ocupar um lugar ainda inexistente, tanto no mundo quanto dentro de mim. Isso me dá medo.
Mas assim como, aos poucos, eu fui entendendo o que é ser estudante de Nutrição, eu creio que poderei compreender o que é ser Nutricionista.
Usar a cordinha nova do crachá é um pequeno lembrete de que eu já percorri metade desse caminho, e agora, só me resta finalizar a estrada.
E esse caminho tá sendo percorrido e escrito com muita empenho e dedicação. Que orgulho que eu tenho de ti!